A Constituição de 1988 é um bom reflexo da forma como a Educação e a Cultura são encarados pelo Estado e pela sociedade.
Ambas estão concentradas no Capítulo III: "Da Educação, da Cultura e do Desporto". A Seção I, "Da Educação", tem incisos que aproximam a dita Carta Cidadã de uma peça de ficção, tamanha a carência de objetividade. Exemplos:
(Art. 206) VII - garantia de padrão de qualidade;
(Art 208) V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
Outros pontos são contraditórios e polêmicos, em relação ao financiamento. A união deve gastar na educação 18% do que arrecada, enquanto os estados e municípios, 25%. O problema é que o artigo 212 fala em "manutenção e desenvolvimento do ensino". Ou seja, por exemplo, a merenda fica de fora. Só que o inciso VII do artigo 208 diz que é dever do Estado assegurar "atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde".
E de onde viriam os recursos?
O § 4o do artigo 212 não é claro: "Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde [...] serão financiados com recursos provenientes de contribuições sociais e outros recursos orçamentários".
Assim, um prefeito pode alegar que dos 25% que arrecadou não sobrou para comprar merenda, nem tinha "contribuições sociais" suficientes, e aí? No mínimo, enrolado.
O § 1o do artigo 213, por sua vez, deixa margem para "malversação do dinheiro público", ao permitir que recursos públicos possam ser empregados em "bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares na rede pública na localidade de residência do educando, ficando o o poder público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade".
Não sei se é fácil "demonstrar insuficiência de recursos" ou comprovar falta de vaga perto da residência, o que sei é que o que tem de apadrinhado de prefeito do interior pegando carona na lei pra estudar às nossas custas em escola particular é uma festa. Depois não tem merenda, ou tem mas é ruim, e ninguém sabe por quê.
Com relação à Cultura a situação é pior. São dois míseros artigos a integrar a Seção II do Capítulo III. A Cultura ocupa meia página da Constituição brasileira.
E, diferentemente da Educação, não há percentual obrigatório de investimento estatal, apenas: "É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a fundo estadual de fomento à cultura até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, para o financiamento de programas e projetos culturais[...]" (Art.216, § 6o). Ou seja, 0,5% do que os estados arrecadam, opcionais.
Para a Ciência e Tecnologia (Cap. IV), o mesmo tratamento: "É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de sua receita orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à pesquisa científica e tecnológica." (Art.218, § 5o).
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