28.12.09
15.12.09
Ordinário
Vimos que "persona" é "máscara" e que a partícula "gem" dá idéia de movimento, ação, ato, processo.
Epaminondas não costuma perder nenhum capítulo da novela das oito. Não porque seja fã de teledramaturgia, mas pra ter assunto. Toda mulher que chega na repartição ele comenta "Fulana perdeu o bebê, não foi?"
Já futebol, não acompanha, pois basta perguntas genéricas como "quem é o líder?" para render algumas frases. Depois do primeiro fã do ludopédio interceptado no corredor, ele já sabe que time vai bem e qual está penando. Mesmo assim, ao encontrar o segundo, vem a inquisição: "E aí, quem tá liderando agora?"
É o máximo de interação que Epaminondas consegue. Tem a rara capacidade de não criar, ou sequer reter algum conhecimento que possa passar adiante. Epaminondas é, portanto, invisível.
E Epaminondas também não recebe mensalão. Não largou a mulher pela amante de 19 anos, não abusou da filha do vizinho, não é gremista e muito menos achou o máximo o Calypso gravar com Paralamas.
Não deixa pra cuspir em casa só porque acha falta de educação escarrar na rua. Epaminondas nem se chama Epaminondas. Epaminondas não é um personagem.
No próximo capítulo falarei sobre a inutilidade das vogais.
Epaminondas não costuma perder nenhum capítulo da novela das oito. Não porque seja fã de teledramaturgia, mas pra ter assunto. Toda mulher que chega na repartição ele comenta "Fulana perdeu o bebê, não foi?"
Já futebol, não acompanha, pois basta perguntas genéricas como "quem é o líder?" para render algumas frases. Depois do primeiro fã do ludopédio interceptado no corredor, ele já sabe que time vai bem e qual está penando. Mesmo assim, ao encontrar o segundo, vem a inquisição: "E aí, quem tá liderando agora?"
É o máximo de interação que Epaminondas consegue. Tem a rara capacidade de não criar, ou sequer reter algum conhecimento que possa passar adiante. Epaminondas é, portanto, invisível.
E Epaminondas também não recebe mensalão. Não largou a mulher pela amante de 19 anos, não abusou da filha do vizinho, não é gremista e muito menos achou o máximo o Calypso gravar com Paralamas.
Não deixa pra cuspir em casa só porque acha falta de educação escarrar na rua. Epaminondas nem se chama Epaminondas. Epaminondas não é um personagem.
No próximo capítulo falarei sobre a inutilidade das vogais.
21.11.09
Tirado da coluna de Xico Sá no Yahoo:
"Se o seu marido fuma, não arrume briga pelo simples fato de cair cinzas no tapete. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa." (Jornal das Moças, 1957).
"Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas". (Jornal das Moças,1957)
"O noivado longo é um perigo, mas nunca sugira o matrimônio. ELE é quem decide - sempre!" (Revista Querida, 1953)
"Sempre que o homem sair com os amigos e voltar tarde da noite espere-o linda, cheirosa e dócil." (Jornal das Moças, 1958)
"Se o seu marido fuma, não arrume briga pelo simples fato de cair cinzas no tapete. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa." (Jornal das Moças, 1957).
"Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas". (Jornal das Moças,1957)
"O noivado longo é um perigo, mas nunca sugira o matrimônio. ELE é quem decide - sempre!" (Revista Querida, 1953)
"Sempre que o homem sair com os amigos e voltar tarde da noite espere-o linda, cheirosa e dócil." (Jornal das Moças, 1958)
17.11.09
A Realidade me disse "oi"
Quinta passada foi a primeira vez em meses que eu fui à UFPB pela manhã. Foi quando experimentei duas sensações estranhas.
Estou no corredor do CCHLA, próximo à Praça da Alegria, quando sinto alguém bater nas minhas costas.
- Oi.
Era a minha sobrinha Rafaela, fera de Administração. Assim, mais cedo ou mais tarde isso aconteceria, né. Mas é totalmente diferente eu saberque ela passou no vestibular, começou a frequentar as aulas, de vê-la na universidade, com pasta e tudo. Aquela coisa de mundo das idéias e mundo das coisas, sabe? Só então caiu a primeira ficha: já sou tio de uma universitária.
A segunda foi uma decorrência natural da outra: era a Realidade, ali, cutucando minhas costas e avisando: você está ficando velho*.
*E ranzinza demais pra conseguir ver alguma graça em modinhas como Lady Gaga. Mas isso já é outra história.
Estou no corredor do CCHLA, próximo à Praça da Alegria, quando sinto alguém bater nas minhas costas.
- Oi.
Era a minha sobrinha Rafaela, fera de Administração. Assim, mais cedo ou mais tarde isso aconteceria, né. Mas é totalmente diferente eu saberque ela passou no vestibular, começou a frequentar as aulas, de vê-la na universidade, com pasta e tudo. Aquela coisa de mundo das idéias e mundo das coisas, sabe? Só então caiu a primeira ficha: já sou tio de uma universitária.
A segunda foi uma decorrência natural da outra: era a Realidade, ali, cutucando minhas costas e avisando: você está ficando velho*.
*E ranzinza demais pra conseguir ver alguma graça em modinhas como Lady Gaga. Mas isso já é outra história.
2.11.09
"Você matou um homem apenas porque ele se desnudou na sua frente?"
"Não, não... Sim, também por isso."
"O que você fez com o corpo?"
"Vesti-o com suas roupas - já me acostumara a vestir gente morta - e ensaiei, como se fôssemos dois bailarinos, o modo de transportá-lo para a rua. Ele era frágil, pequeno, pesava apenas uns cinquenta quilos. Passei seu braço direito em torno do meu pescoço, segurei sua mão direita com minha mão esquerda e enlacei-o fortemente pela cintura com meu braço direito, levantando-o um pouco, de maneira que seus pés mal tocavam o chão. Passeei - na verdade, dancei - com ele dentro do quarto, em frente ao espelho. Eu queria que ele parecesse um bêbado sendo conduzido para casa por um amigo dedicado. Quer que eu te mostre como? Põe o braço aqui."
"Não."
"Esperei algumas horas, até pouco antes da madrugada, uma hora morta nos hotéis, em que a portaria está sempre ocupada por funcionários menos competentes. Saí com Sandro, passei pela portaria dizendo ao porteiro sonolento e desinteressado que meu amigo se excedera na bebida. Deixei-o sentado numa das cadeiras de calçada, presas à mesa por correntes para que não fossem roubadas, de um bar àquela hora fechado. Tirei todo o dinheiro do seu bolso e o relógio de pulso, do qual me livrei ao voltar para Paris."
"E o corpo não foi achado?"
"Foi. Saiu uma notícia pequena nos jornais, dizendo que Sandro Morelli - esse era seu nome completo - tinha uma ficha criminal de prostituição masculina, furto e outras infrações menores. A polícia voltou sua atenção para pistas falsas, suspeitos inocentes. Mais uma vez eu fora salvo pela estupidez da polícia."
"Não sei o que pensar", diz Clotilde. "Você não me parece um assassino reincidente. Mas sinto que é tudo verdade. E me pergunto, serei a próxima?"
"Deixa eu mordeu teu joelho", diz Landers, deitando-se de costas no chão.
Clotilde, inteiramente nua, ajoelha-se sobre Landers de forma a que o tórax do homem fique entre suas pernas abertas. Depois levanta um dos joelhos e encosta-o na boca de Landers. ele morde a rótula de Clotilde, deslocando o osso suavemente. Depois morde o outro joelho.
"Morde primeiro minha clavícula", diz Clotilde, curvando-se sobre ele. "Com mais força. Pobrezinho..."
Romance Negro, Rubem Fonseca
"Não, não... Sim, também por isso."
"O que você fez com o corpo?"
"Vesti-o com suas roupas - já me acostumara a vestir gente morta - e ensaiei, como se fôssemos dois bailarinos, o modo de transportá-lo para a rua. Ele era frágil, pequeno, pesava apenas uns cinquenta quilos. Passei seu braço direito em torno do meu pescoço, segurei sua mão direita com minha mão esquerda e enlacei-o fortemente pela cintura com meu braço direito, levantando-o um pouco, de maneira que seus pés mal tocavam o chão. Passeei - na verdade, dancei - com ele dentro do quarto, em frente ao espelho. Eu queria que ele parecesse um bêbado sendo conduzido para casa por um amigo dedicado. Quer que eu te mostre como? Põe o braço aqui."
"Não."
"Esperei algumas horas, até pouco antes da madrugada, uma hora morta nos hotéis, em que a portaria está sempre ocupada por funcionários menos competentes. Saí com Sandro, passei pela portaria dizendo ao porteiro sonolento e desinteressado que meu amigo se excedera na bebida. Deixei-o sentado numa das cadeiras de calçada, presas à mesa por correntes para que não fossem roubadas, de um bar àquela hora fechado. Tirei todo o dinheiro do seu bolso e o relógio de pulso, do qual me livrei ao voltar para Paris."
"E o corpo não foi achado?"
"Foi. Saiu uma notícia pequena nos jornais, dizendo que Sandro Morelli - esse era seu nome completo - tinha uma ficha criminal de prostituição masculina, furto e outras infrações menores. A polícia voltou sua atenção para pistas falsas, suspeitos inocentes. Mais uma vez eu fora salvo pela estupidez da polícia."
"Não sei o que pensar", diz Clotilde. "Você não me parece um assassino reincidente. Mas sinto que é tudo verdade. E me pergunto, serei a próxima?"
"Deixa eu mordeu teu joelho", diz Landers, deitando-se de costas no chão.
Clotilde, inteiramente nua, ajoelha-se sobre Landers de forma a que o tórax do homem fique entre suas pernas abertas. Depois levanta um dos joelhos e encosta-o na boca de Landers. ele morde a rótula de Clotilde, deslocando o osso suavemente. Depois morde o outro joelho.
"Morde primeiro minha clavícula", diz Clotilde, curvando-se sobre ele. "Com mais força. Pobrezinho..."
Romance Negro, Rubem Fonseca
10.10.09
Enquanto isso, na sala de professores
- Não aguento quando vêm pra mim com essa falsa modéstia de chamar negro de moreno! - Diz, entrando na sala e caminhando até a mesa, um professor negro. - Nós, pessoas cultas, não podemos permitir isso! - Senta, puxando a cadeira com raiva.
- É porque tem muitas pessoas morenas que acham que é preconceito. Ah, não aguento mais essa conversa! - Responde, impaciente, uma professora branca. - Esse assunto é muito cafona... O movimento negro tem muita hipocrisia, coisa de quem não tem o que fazer.
- É porque tem muitas pessoas morenas que acham que é preconceito. Ah, não aguento mais essa conversa! - Responde, impaciente, uma professora branca. - Esse assunto é muito cafona... O movimento negro tem muita hipocrisia, coisa de quem não tem o que fazer.
18.9.09
Acontece na vida...
O documentário Pro dia nascer feliz apresenta uma adolescente pobre do interior de Pernambuco que escreve poemas tão bons que ninguém acredita que saíram da cabeça dela. Os olhares de desconfiança fizeram a menina sentir vergonha de mostrar o que produzia.
Uma colega minha que dá aula no ensino fundamental numa escola da periferia me contou que uma de suas alunas escreveu um poeminha sobre seu gato e quis inscrever num concurso de redação promovido pela prefeitura. E a diretora não quer permitir, porque acredita que só pode ter sido plágio.
Uma colega minha que dá aula no ensino fundamental numa escola da periferia me contou que uma de suas alunas escreveu um poeminha sobre seu gato e quis inscrever num concurso de redação promovido pela prefeitura. E a diretora não quer permitir, porque acredita que só pode ter sido plágio.
5.9.09
19.8.09
Sento-me sozinha, sob a sombra de uma árvore, e fumo arguile
Eu continuo indefinidamente, e me sinto agonizantemente feminina, e audaciosamente masculina, ambos ao mesmo tempo
Enquanto eu gentilmente aloco meus lábios no bocal de madeira e sugo a fumaça, eu ouço o borbulhar da água embaixo, e assisto aos carvões responderem com uma chama acanhada
Elas falam comigo em tom de provocação, e o fazem de forma tão simples e calma, que não precisam fazer ruídos para exigir
Porque no seu silêncio jaz o poder da explícita persuasão
E só Deus sabe como há muito eu tenho sido persuadida
Persuadida pela arguile, e o seu sabor que inesperadamente toma conta do meu ser.
Mona Hamze
Washington, DC
Em algum tempo nos anos 80
Gostaram? Mais construtivas informações sobre o culto ao Narguilê você encontra neste site, como esta:
Fumar arguile não é como fumar cigarro, simplesmente acender, fumar e pronto. A arguile deve ser fumada de forma especial, ou com os amigos, ou sozinho, refletindo. É importante estar em um ambiente de temperatura agradável, ter alguma coisa coisa que se goste para beber (pode ser suco, refrigerante, bebida alcóolica), enfim, estar confortável e relaxado.
Eu continuo indefinidamente, e me sinto agonizantemente feminina, e audaciosamente masculina, ambos ao mesmo tempo
Enquanto eu gentilmente aloco meus lábios no bocal de madeira e sugo a fumaça, eu ouço o borbulhar da água embaixo, e assisto aos carvões responderem com uma chama acanhada
Elas falam comigo em tom de provocação, e o fazem de forma tão simples e calma, que não precisam fazer ruídos para exigir
Porque no seu silêncio jaz o poder da explícita persuasão
E só Deus sabe como há muito eu tenho sido persuadida
Persuadida pela arguile, e o seu sabor que inesperadamente toma conta do meu ser.
Mona Hamze
Washington, DC
Em algum tempo nos anos 80
Gostaram? Mais construtivas informações sobre o culto ao Narguilê você encontra neste site, como esta:
Fumar arguile não é como fumar cigarro, simplesmente acender, fumar e pronto. A arguile deve ser fumada de forma especial, ou com os amigos, ou sozinho, refletindo. É importante estar em um ambiente de temperatura agradável, ter alguma coisa coisa que se goste para beber (pode ser suco, refrigerante, bebida alcóolica), enfim, estar confortável e relaxado.
17.8.09
João Pessoa, 17 de agosto do ano da Graça de 2009, 1h52 da tarde.
Bruno R corrige redações de alunos da terceira série do ensino médio.
A Amazônia ela produz a parte maior de sua própria chuva, porquê ela é bastante grande.
O excesso do desmatamento pode degradar o ciclo hidrológico porque não são apenas essencial para a manutenção das nossas floresta mais ela também garante o significado da chuva.
O desmatamento pode acabar com varias coisas, tipo assim, com o ciclo Hidrológico, com a nossa manutenção de grandes floresta e com a energia hidreletrica etc...
Bruno R corrige redações de alunos da terceira série do ensino médio.
A Amazônia ela produz a parte maior de sua própria chuva, porquê ela é bastante grande.
O excesso do desmatamento pode degradar o ciclo hidrológico porque não são apenas essencial para a manutenção das nossas floresta mais ela também garante o significado da chuva.
O desmatamento pode acabar com varias coisas, tipo assim, com o ciclo Hidrológico, com a nossa manutenção de grandes floresta e com a energia hidreletrica etc...
10.8.09
Seus ídolos vão de Chico Xavier a Cristovam Buarque. O endereço não poderia ser mais poético: Avenida da Fraternidade. Nunca quis pôr cimento no vasto quintal da casa que mora há 31 anos - "faço questão de sentir a terra". Oliveira de Panelas só tira o pé do chão quando analisa a pandemia de Gripe A: "Não passa de invencão da mídia internacional pro povo esquecer a crise econômica."
7.8.09
Fica a dica pra quem tiver à procura de tema pra pós em literatura comparada. Trata-se da óbvia relação entre "Beber, cair e levantar" e "Relicário", de Oswald de Andrade:
No baile da corte
Foi o conde d’Eu quem disse
Pra Dona Benvinda
Que farinha de Suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É comê bebê pitá e caí
No baile da corte
Foi o conde d’Eu quem disse
Pra Dona Benvinda
Que farinha de Suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É comê bebê pitá e caí
28.7.09
A bala, ou projétil, parte, ou sai, do fuzil, ou arma. Quando o homem, ou soldado, ouve ou escuta, o silvo, ou ruído, da bala ou projétil, joga-se, ou atira-se, por terra, ou chão. Com numerosas variantes ouvi essa técnica de defesa ou proteção, que o infante, ou praça, devia empregar, ou usar, ao primeiro sibilo de refrega, ou combate. Era deitar imediatamente e contra-atacar dessa posição, tentando de todos os modos exterminar, ou matar, o inimigo, ou adversário. Devia-se mirar cuidadosamente o crânio, mandar bala no dito, e se a distância era grande, não permitindo requintes de pontaria, tentar-se-ia acertar no centro, ou meio, da silhueta, ou vulto, e destarte, ou assim, era certo, ou seguro, atingir, ou ferir, o abdome, ou ventre.*
*Trecho de Chão de ferro, livro de memórias de Pedro Nava, onde o autor relembra uma instrução militar que recebeu de um capitão que gostava de falar difícil e usar pares de sinônimos. Quem é da Zero Zero Um vai lembrar de Custódio.
*Trecho de Chão de ferro, livro de memórias de Pedro Nava, onde o autor relembra uma instrução militar que recebeu de um capitão que gostava de falar difícil e usar pares de sinônimos. Quem é da Zero Zero Um vai lembrar de Custódio.
26.7.09
João Pessoa havia deixado a Paraíba,
- Informava A União sobre a partida.
João Dantas, ferido no orgulho,
Do rival foi atrás. Era 26 de julho.
“À vizinha metrópole do Sul” fôra o Presidente
Visitar um amigo, que estava doente.
Porém o jornal oficial
Disse mais do que precisava,
E o mal, sem saber, antecipava:
O governante, quando em Recife,
Tomava chá na confeitaria.
Era a pista que ao patife faltava
Pra cometer a covardia.
A União (Que ironia!) deu a deixa ao assassino,
Que deve ter pensado:
"É hoje que eu mato aquele filho da puta!"
E na nota do jornal, o vaticínio mortal,
Do que chocaria o Estado:
"A demora do chefe do governo será muito curta."
- Informava A União sobre a partida.
João Dantas, ferido no orgulho,
Do rival foi atrás. Era 26 de julho.
“À vizinha metrópole do Sul” fôra o Presidente
Visitar um amigo, que estava doente.
Porém o jornal oficial
Disse mais do que precisava,
E o mal, sem saber, antecipava:
O governante, quando em Recife,
Tomava chá na confeitaria.
Era a pista que ao patife faltava
Pra cometer a covardia.
A União (Que ironia!) deu a deixa ao assassino,
Que deve ter pensado:
"É hoje que eu mato aquele filho da puta!"
E na nota do jornal, o vaticínio mortal,
Do que chocaria o Estado:
"A demora do chefe do governo será muito curta."
21.7.09
Ego grande
Uma notícia que li ontem no Paraíba1 me fez rir. Sem querer admitir que o Festival de Inverno de Garanhuns é zilhões de vezes melhor que o de Campina Grande, a organizadora do festival campinense, Eneida Maracajá, me sai com esta:
Eneida também rebateu as comparações que vêm sendo feitas na cidade entre o evento de Campina Grande e o Festival de Inverno de Garanhuns (PE), ressaltando que os dois eventos têm objetivos diferentes.
Eneida ressaltou que, na Rainha da Borborema, não há preocupação com festas, mas sim, com a formação cultural da cidade. "Lá, eles não têm festa, aqui temos demais! Campina Grande já está cansada de tanto show. Então, nossa preocupação é com a formação cultural desta cidade, com discussões, reflexões, intercâmbio cultural e troca de saberes. Isso é o que importa: proporcionar o contato da população com outros gêneros", asseverou.
Eneida também rebateu as comparações que vêm sendo feitas na cidade entre o evento de Campina Grande e o Festival de Inverno de Garanhuns (PE), ressaltando que os dois eventos têm objetivos diferentes.
Eneida ressaltou que, na Rainha da Borborema, não há preocupação com festas, mas sim, com a formação cultural da cidade. "Lá, eles não têm festa, aqui temos demais! Campina Grande já está cansada de tanto show. Então, nossa preocupação é com a formação cultural desta cidade, com discussões, reflexões, intercâmbio cultural e troca de saberes. Isso é o que importa: proporcionar o contato da população com outros gêneros", asseverou.
15.7.09
Pensa que Dostoievski é uma unanimidade?
E as descrições! Nada se compara ao nada delas; não passam de superposições de imagens de catálogo, de que o autor se serve cada vez mais à vontade, ele aproveita a ocasião para me passar seus cartões postais, procura fazer-me ficar de acordo com ele a respeito de lugares comuns:
A pequena peça na qual o jovem foi introduzido era atapetada de papel amarelo: havia ali gerânios e cortinas de musseline nas janelas; o sol poente lançava sobre toda ela uma luz crua... O quarto nada encerrava de especial. Os móveis, de madeira amarela, eram todos muito velhos. Um sofá com um grande espaldar virado, uma mesa de formato oval em frente ao sofá, um toucador e um espelho encostados num vão de parede entre duas janelas, cadeiras ao longo das paredes, duas ou três gravuras sem valor, representando moças alemãs com pássaros nas mãos – eis a que se reduzia o mobiliário. (Crime e castigo)*
* André Breton - Manifesto do Surrealismo
A pequena peça na qual o jovem foi introduzido era atapetada de papel amarelo: havia ali gerânios e cortinas de musseline nas janelas; o sol poente lançava sobre toda ela uma luz crua... O quarto nada encerrava de especial. Os móveis, de madeira amarela, eram todos muito velhos. Um sofá com um grande espaldar virado, uma mesa de formato oval em frente ao sofá, um toucador e um espelho encostados num vão de parede entre duas janelas, cadeiras ao longo das paredes, duas ou três gravuras sem valor, representando moças alemãs com pássaros nas mãos – eis a que se reduzia o mobiliário. (Crime e castigo)*
* André Breton - Manifesto do Surrealismo
13.7.09
A Praça da Paz é a praia dos Bancários
A lua começa a esvaziar, mas compensa a parte oculta pela sombra com um brilho incomum. Uns garotos transformam uma garrafa de vinho barato (tão barato que a garrafa é de plástico) em bola. Outros, um pouco mais velhos, escutam o forró (também de plástico, também barato) que sai dos alto-falantes de um carro. Crianças brincam. Duas moças conversam. Casais, vários casais. Um homem corre e sua. Outro homem olha a lua.
15.6.09
1.6.09
O leitor e o imperador
O silêncio era feio e o desespero também. De vez em quando Macunaíma parava pensando na marvada... Que desejo batia nele! Parava tempo. Chorava muito tempo. As lágrimas escorregando pelas faces infantis do herói iam lhe batizar a peitaria cabeluda. Então ele suspirava sacudindo a cabecinha:
- Qual manos! Amor primeiro não tem companheiro, não!...
- Qual manos! Amor primeiro não tem companheiro, não!...
20.5.09
Terra undívaga
"Muitas vezes, o desejo de fugir à vulgaridade traz como consequência o uso de preciosismos que tanto prejudicam a concisão quanto a própria clareza da frase. Saint-Paul-Roinard disse que o galo era 'um pequeno campanário vermelho bimbalhando pela aurora.' Alexandre Herculano evitou a palavra nádegas mediante o seguinte circunlóquio: 'bombagina estufada de certa porção convexa da carne humana'. O adágio 'aí é que a porca torce o rabo', em virtude das conotações negativas das palavras porca e rabo, passou a ter outra versão na linguagem de Herculano: 'Aí é que certo animal torcia certa parte do corpo que eu e leitor sabemos'. No estilo barroco, caracterizado pela pomposidade, em vez de oceano, escrevia-se terra undívaga onde as quilhas aram'. O vagalume era 'um carbúnculo, diamante vivo com que a noite touca as boninas rústicas dos campos'. Não se dizia ofender, mas "deslustrar o resplendor civil de alguém". Para Frei Lucas de Santa Catarina, o túmulo era o 'arquivo do esquecimento', o cemitério, 'veneranda hospedagem das relíquias dos primeiros da terra'".
16.5.09
A nova estrada
A orientação de ampliar o acesso ao ensino superior gratuito não se restringe à criação de novas universidades ou ampliação das já existentes. Para reunir as instituições que oferecem cursos à distância (EAD), o governo criou a UAB (Universidade Aberta do Brasil).
A UFPB está nessa e faz seu terceiro vestibular no próximo dia 24, com 8.710 candidatos concorrendo a 2.115 vagas. Com a nova leva, a UFPB virtual passará a ter mais de 6 mil alunos, cerca de um quarto do número de alunos convencionais da instituição. Lembrando que o número de cursos oferecidos à distância ainda é reduzido, pois o foco são as áreas que formam professores para a educação básica, ou seja, pedagogia e licenciaturas.
A ideía da UAB é levar a universidade a pequenos municípios que não tenham campi ou ampliar o número de vagas naqueles que já têm (por isso existem pólos em João Pessoa e Campina Grande). A implantação dos pólos se dá de forma similar ao Samu: envolve as três esferas de governo. Daí a importância de um prefeito com boa vontade e visão. Muitos administradores acreditam que investir em saúde é comprar ambulância pra transportar doentes, bem como consideram investimento em educação arranjar um ônibus pra levar os estudantes para estudar nas cidades maiores.
Se entendi bem, a estrutura do pólo é simples: uma sala equipada com computadores ligados à internet. O resto, ou seja, o pagamento de monitores e professores bem como toda a arquitetura do ensino é com a universidade. Por falar em professores, na parte presencial do curso são eles que vão até o aluno, em sua cidade, e não o contrário.
Um fato interessante na UAB é que a expansão das universidades não respeita as fronteiras dos estados a que elas pertencem, o que gera algumas curiosidades. Por exemplo, a pequena Duas Estradas-PB tem um curso de licenciatura em Educação Física oferecido por nada menos que a UnB! Já a UFPB Virtual, além das cidades do interior do estado, tem pólos em Pernambuco, Ceará e até na Bahia.
Caladinho, à margem de discussões que estão sempre nos holofotes, como a das cotas, o EAD cresce e arrebanha entusiastas. Um deles é Claudio de Moura Castro, colaborador da Veja, que escreveu sobre o tema na edição de 15 de abril da revista. Apesar de reconhecer algumas desvantagens ("exige pessoas mais maduras e mais disciplinadas, pois são quatro anos estudando sozinhas"), ele cita o Enade como prova de que o ensino à distância é o futuro: "Em metade dos cursos avaliados, os programas à distância mostram resultados melhores do que os presenciais!" E não para por aí: "Cada vez mais, o presencial se combina com segmentos a distância, com o uso da internet, e-learning, vídeos do tipo YouTube e até o prosaico celular. A educação presencial bolorenta está sendo ameaçada pelas múltiplas combinações do presencial com tecnologia e distância." Será?
A UFPB está nessa e faz seu terceiro vestibular no próximo dia 24, com 8.710 candidatos concorrendo a 2.115 vagas. Com a nova leva, a UFPB virtual passará a ter mais de 6 mil alunos, cerca de um quarto do número de alunos convencionais da instituição. Lembrando que o número de cursos oferecidos à distância ainda é reduzido, pois o foco são as áreas que formam professores para a educação básica, ou seja, pedagogia e licenciaturas.
A ideía da UAB é levar a universidade a pequenos municípios que não tenham campi ou ampliar o número de vagas naqueles que já têm (por isso existem pólos em João Pessoa e Campina Grande). A implantação dos pólos se dá de forma similar ao Samu: envolve as três esferas de governo. Daí a importância de um prefeito com boa vontade e visão. Muitos administradores acreditam que investir em saúde é comprar ambulância pra transportar doentes, bem como consideram investimento em educação arranjar um ônibus pra levar os estudantes para estudar nas cidades maiores.
Se entendi bem, a estrutura do pólo é simples: uma sala equipada com computadores ligados à internet. O resto, ou seja, o pagamento de monitores e professores bem como toda a arquitetura do ensino é com a universidade. Por falar em professores, na parte presencial do curso são eles que vão até o aluno, em sua cidade, e não o contrário.
Um fato interessante na UAB é que a expansão das universidades não respeita as fronteiras dos estados a que elas pertencem, o que gera algumas curiosidades. Por exemplo, a pequena Duas Estradas-PB tem um curso de licenciatura em Educação Física oferecido por nada menos que a UnB! Já a UFPB Virtual, além das cidades do interior do estado, tem pólos em Pernambuco, Ceará e até na Bahia.
Caladinho, à margem de discussões que estão sempre nos holofotes, como a das cotas, o EAD cresce e arrebanha entusiastas. Um deles é Claudio de Moura Castro, colaborador da Veja, que escreveu sobre o tema na edição de 15 de abril da revista. Apesar de reconhecer algumas desvantagens ("exige pessoas mais maduras e mais disciplinadas, pois são quatro anos estudando sozinhas"), ele cita o Enade como prova de que o ensino à distância é o futuro: "Em metade dos cursos avaliados, os programas à distância mostram resultados melhores do que os presenciais!" E não para por aí: "Cada vez mais, o presencial se combina com segmentos a distância, com o uso da internet, e-learning, vídeos do tipo YouTube e até o prosaico celular. A educação presencial bolorenta está sendo ameaçada pelas múltiplas combinações do presencial com tecnologia e distância." Será?
19.4.09
(...)
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...
9.4.09
Três motivos pra não assistir a Paixão de Cristo da Prefeitura
1. Em "A Paixão do Menino Deus", a Via Crucis é atualizada pro século XXI e Cristo e sua turma ganham novos nomes. Judas Iscariotes, por exemplo, vira "Juca Carioca".
2. Na versão de Tarcísio Pereira, Emanuel, isto é, Jesus, também opera milagres. No entanto, em vez de verter água em vinho, ele transforma pedra de crack em miolo de pão.
3. O filho de Deus é interpretado pelo Galego de Psicologia.
2. Na versão de Tarcísio Pereira, Emanuel, isto é, Jesus, também opera milagres. No entanto, em vez de verter água em vinho, ele transforma pedra de crack em miolo de pão.
3. O filho de Deus é interpretado pelo Galego de Psicologia.
31.3.09
Entre as opções que os multiplexes pessoenses disponibilizam para esta semana estão dois filmes com "cachorro" no título e outro cuja sinopse é:
A jovem Casey Bell não sabia que tinha um irmão gêmeo, muito menos que ele havia morrido antes do parto. A melhor maneira de descobrir é sendo assombrada pelo espírito dele, que quer assumir seu corpo.
A jovem Casey Bell não sabia que tinha um irmão gêmeo, muito menos que ele havia morrido antes do parto. A melhor maneira de descobrir é sendo assombrada pelo espírito dele, que quer assumir seu corpo.
26.3.09
Enquanto o Twitter não vem...
O Blogger imitou geral o Twitter com essas história de "seguidores". Parece que eu tenho que atualizar o template para o gadget bonitinho dos seguidores aparecer ali ao lado. Atualmente, vc tem que ir até o meu perfil pra ver quem eu "sigo". Bom, depois faço isso. E mais depois ainda eu faço um twitter, prometo.
Meus três times perderam hoje. Quer dizer, o Botafogo empatou. Mas empate em casa contra o Americano é derrota.
Descobri um interesse súbito das minhas sobrinhas por livros. Ou pelo menos os livros dessa nerd gatinha. Elas estão lendo Crepúsculo e quando vi que estavam atrás do segundo da série, Lua Nova, resolvi comprar. Notem que nunca comprei livro pela net pra mim, mas comprei pra elas. Vejam que tio zeloso eu sou.
Os livros da mulher, diga-se de passagem, vendem como água. Parece que já vão virar filmes e tudo. E eu nunca tinha ouvido falar até minha sobrinhas, sem querer, me apresentarem.
Álcool não me deixa alegre. Só ajuda a dormir.
Meus três times perderam hoje. Quer dizer, o Botafogo empatou. Mas empate em casa contra o Americano é derrota.
Descobri um interesse súbito das minhas sobrinhas por livros. Ou pelo menos os livros dessa nerd gatinha. Elas estão lendo Crepúsculo e quando vi que estavam atrás do segundo da série, Lua Nova, resolvi comprar. Notem que nunca comprei livro pela net pra mim, mas comprei pra elas. Vejam que tio zeloso eu sou.
Os livros da mulher, diga-se de passagem, vendem como água. Parece que já vão virar filmes e tudo. E eu nunca tinha ouvido falar até minha sobrinhas, sem querer, me apresentarem.
Álcool não me deixa alegre. Só ajuda a dormir.
21.3.09
Legado luso
"(...)O autor exclui da sua análise os naufrágios resultantes de acasos ou acidentes que como o próprio defende são incontornáveis e inevitáveis numa ligação tão extensa como era a Carreira da Índia. As principais causas apontadas são a cobiça de todos e a falta de ordem na carga dos navios, multiplicando os exemplos saídas de Goa com as naus metidas no fundo e com tamanha carga que nem a manobra de velas ou artilharia é possível. Outra causa importante é a querena à italiana que permitia trabalhar na calafetagem sem pôr o navio a seco mas que apresentava diversas contrariedades visto não ser tão duradoura como a anteriormente praticada. A introdução de tal prática deve-se exclusivamente, segundo Estácio do Amaral, à vontade de poupar tempo e dinheiro e de se ter entregue tais trabalhos a contratadores que têm como preocupação a rentabilidade da operação e não a segurança.
É nestas condições que Estácio do Amaral conclui terem-se perdido 38 navios em 20 anos (1582-1602) muito por causa do abandono a que estaria votada a nossa marinha e à falta de cuidado dos portugueses em tratarem dos aspectos de segurança."
Rui Godinho
É nestas condições que Estácio do Amaral conclui terem-se perdido 38 navios em 20 anos (1582-1602) muito por causa do abandono a que estaria votada a nossa marinha e à falta de cuidado dos portugueses em tratarem dos aspectos de segurança."
Rui Godinho
13.3.09
Ela tem 18 anos, eu vou fazer 56...
Bancários, fim de tarde de sexta-feira.
Não era axé, nem forró, nem funk. Ao lado de casa passa um Celta tunado, com o som a toda potência tocando... Noite Ilustrada!
E eu preciso fazer um twitter.
Não era axé, nem forró, nem funk. Ao lado de casa passa um Celta tunado, com o som a toda potência tocando... Noite Ilustrada!
E eu preciso fazer um twitter.
16.2.09
Marta e Léo se esforçaram, mas não conseguiram disfarçar a surpresa quando viram Luciano, que nunca fora amigo íntimo do casal, bater à porta querendo saber se podia deixar as coisas ali.
Pôde. Acendeu um cigarro e começou a caminhar, inicialmente sem rumo. Depois decidiu conferir se a oficina mecânica onde trabalhara ainda existia.
Viu uma farmácia, dessas anabolizadas, 24 horas, ocupando o seu lugar. Chegando mais perto, porém, viu que a oficina ainda estava lá. Mas não era a mesma. A farmácia tinha tomado dois terços do prédio onde fora a Auto Mecânica São Geraldo.
Aproximou-se mais. Não viu rostos, só ouviu ruídos de risadas e televisão. Não queria ser visto pelos antigos companheiros. Mas deixou-se perder por um instante em lembranças e essa demora foi-lhe fatal.
- Ei, aquele não é Luciano?
- É sim, é ele!
Fora descoberto. Não podia fugir. Nem queria falar. Chico, Valmir e Edson sabiam que ele sempre foi calado e meio estranho. Mas agora parecia mais.
Aos quatro juntaram-se duas moças que não eram do tempo de Luciano. Formou-se uma roda de expressões constrangidas, uns com as mãos nos bolsos, outros coçando a barba, uns fitando o chão, outros se entreolhando.
Ninguém falava nada e Luciano teve tempo para observar o lugar com mais atenção. Aquilo parecia tudo, menos uma oficina: o chão limpo, as paredes cheirando a tinta fresca e, finalmente, nenhum carro de capô erguido.
- A gente tá reformando.
Essas quatro palavras de Edson fizeram aquele grupo redescobrir a faculdade de comunicar-se.
- A nossa idéia é fazer uma oficina junto com um salão de beleza. Pra atrair a freguesia feminina, né? E também os maridos que vierem com as esposas vão poder dar uma olhada no carro enquanto esperam a patroa. Agora e gente enrica! - Emendou Valmir, esperando, em vão, pela opinião de Luciano.
Chico tentou mudar de assunto:
- Você se formou em quê mesmo?
Luciano olhou para o amigo e viu, por sobre seus ombros, ao longe, a ponte.
Onze anos antes, num dia ensolarado como aquele, notou o reflexo do sol poente no rio pela janela do ônibus e pensou que em São Paulo jamais veria algo parecido com aquilo. Mesmo se a poluição deixasse, não haveria tempo, não haveria horizonte, não a veria.
- Eu vou cortar seu cabelo, vem. - Propôs Glória.
Luciano obedeceu.
- Você gosta de sorvete? Aqui na farmácia vende. Ritinha, quando eu acabar aqui pega um sorvete lá pra gente tomar!
- Uma bola de flocos, uma de coco e calda de caramelo.
O espanto foi geral e inevitável. Em qualquer outro contexto soaria como um simples pedido. Porém, era a primeira frase que os velhos colegas ouviam sair da boca de Luciano em mais de uma década. Ritinha e Glória já começavam a achar que o homem era mudo ou doido.
O recém-chegado, ao contrário, se mantinha inexpressivo, imóvel, fitando a si no espelho.
- Ela jogou o sorvete inteiro na minha camisa verde quando eu disse que ia embora. Uma bola de flocos, uma de coco e calda de caramelo. De casquinha.
Pôde. Acendeu um cigarro e começou a caminhar, inicialmente sem rumo. Depois decidiu conferir se a oficina mecânica onde trabalhara ainda existia.
Viu uma farmácia, dessas anabolizadas, 24 horas, ocupando o seu lugar. Chegando mais perto, porém, viu que a oficina ainda estava lá. Mas não era a mesma. A farmácia tinha tomado dois terços do prédio onde fora a Auto Mecânica São Geraldo.
Aproximou-se mais. Não viu rostos, só ouviu ruídos de risadas e televisão. Não queria ser visto pelos antigos companheiros. Mas deixou-se perder por um instante em lembranças e essa demora foi-lhe fatal.
- Ei, aquele não é Luciano?
- É sim, é ele!
Fora descoberto. Não podia fugir. Nem queria falar. Chico, Valmir e Edson sabiam que ele sempre foi calado e meio estranho. Mas agora parecia mais.
Aos quatro juntaram-se duas moças que não eram do tempo de Luciano. Formou-se uma roda de expressões constrangidas, uns com as mãos nos bolsos, outros coçando a barba, uns fitando o chão, outros se entreolhando.
Ninguém falava nada e Luciano teve tempo para observar o lugar com mais atenção. Aquilo parecia tudo, menos uma oficina: o chão limpo, as paredes cheirando a tinta fresca e, finalmente, nenhum carro de capô erguido.
- A gente tá reformando.
Essas quatro palavras de Edson fizeram aquele grupo redescobrir a faculdade de comunicar-se.
- A nossa idéia é fazer uma oficina junto com um salão de beleza. Pra atrair a freguesia feminina, né? E também os maridos que vierem com as esposas vão poder dar uma olhada no carro enquanto esperam a patroa. Agora e gente enrica! - Emendou Valmir, esperando, em vão, pela opinião de Luciano.
Chico tentou mudar de assunto:
- Você se formou em quê mesmo?
Luciano olhou para o amigo e viu, por sobre seus ombros, ao longe, a ponte.
Onze anos antes, num dia ensolarado como aquele, notou o reflexo do sol poente no rio pela janela do ônibus e pensou que em São Paulo jamais veria algo parecido com aquilo. Mesmo se a poluição deixasse, não haveria tempo, não haveria horizonte, não a veria.
- Eu vou cortar seu cabelo, vem. - Propôs Glória.
Luciano obedeceu.
- Você gosta de sorvete? Aqui na farmácia vende. Ritinha, quando eu acabar aqui pega um sorvete lá pra gente tomar!
- Uma bola de flocos, uma de coco e calda de caramelo.
O espanto foi geral e inevitável. Em qualquer outro contexto soaria como um simples pedido. Porém, era a primeira frase que os velhos colegas ouviam sair da boca de Luciano em mais de uma década. Ritinha e Glória já começavam a achar que o homem era mudo ou doido.
O recém-chegado, ao contrário, se mantinha inexpressivo, imóvel, fitando a si no espelho.
- Ela jogou o sorvete inteiro na minha camisa verde quando eu disse que ia embora. Uma bola de flocos, uma de coco e calda de caramelo. De casquinha.
10.2.09
Fé na metapropaganda
Não foi um artigo, notícia ou editorial que me chamou a atenção na página A2 do Correio da Paraíba de ontem. Foi um anúncio publicitário. Na verdade, um anúncio sobre um anúncio.
O anúncio (A1) dizia: Até quem não acredita em nada acredita em propaganda.
O anúncio segue com uma nota sobre outro anúncio (A2):
Ateus lançam campanha no Reino unido
A entidade British Humanist Association (BHA) lançou uma camapanha que atinge 200 ônibus em Londres e outros 600 no resto do Reino Unido para divulgar o ateísmo, por meio do slogan "Provavelmente Deus não existe. Agora, pare de se preocupar e desfrute de sua vida". Os U$ 195 mil investidos na ação, que terá duração de quatro meses, foram arrecadados por doações.
Abaixo da nota, lê-se:
"Fé e direito de expressão não se discutem. Na Inglaterra, os ateus lançaram mão de uma campanha publicitária para divulgar sua crença no fato de que não creem. A própria concorrência, a Igreja, já faz isso por lá há muito tempo. Sem julgar as razões ou o conteúdo de uma campanha de tema tão polêmico, o importante é notar que, em tempos difíceis ou não, a propaganda é sempre fundamental. E nunca fundamentalista. Por isso, se você precisa comunicar, convencer, explicar ou simplesmente vender - seja ideia, princípio, serviço ou produto -, acredite pelo menos em uma coisa: no meio dessa crise mundial, a propaganda é mais do que nunca a resposta. A não ser que você seja mais descrente que os ateus."
O anúncio é da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap). O trecho grifado (por mim) é uma confissão da habilidade que os publicitários têm pra chamar atenção sem tomar partido ("nunca fundamentalista"), sem bulir com ninguém, mesmo quando se mete em polêmicas espinhosas como essa. Isso não é novidade. Assim como não é novidade gente se dando bem usando o nome de Deus. Agora, alguém se promover às custas do ateísmo é a primeira vez que eu vejo. Publicidade é isso: a arte de surpreender sempre sem mudar nunca.
O anúncio (A1) dizia: Até quem não acredita em nada acredita em propaganda.
O anúncio segue com uma nota sobre outro anúncio (A2):
Ateus lançam campanha no Reino unido
A entidade British Humanist Association (BHA) lançou uma camapanha que atinge 200 ônibus em Londres e outros 600 no resto do Reino Unido para divulgar o ateísmo, por meio do slogan "Provavelmente Deus não existe. Agora, pare de se preocupar e desfrute de sua vida". Os U$ 195 mil investidos na ação, que terá duração de quatro meses, foram arrecadados por doações.
Abaixo da nota, lê-se:
"Fé e direito de expressão não se discutem. Na Inglaterra, os ateus lançaram mão de uma campanha publicitária para divulgar sua crença no fato de que não creem. A própria concorrência, a Igreja, já faz isso por lá há muito tempo. Sem julgar as razões ou o conteúdo de uma campanha de tema tão polêmico, o importante é notar que, em tempos difíceis ou não, a propaganda é sempre fundamental. E nunca fundamentalista. Por isso, se você precisa comunicar, convencer, explicar ou simplesmente vender - seja ideia, princípio, serviço ou produto -, acredite pelo menos em uma coisa: no meio dessa crise mundial, a propaganda é mais do que nunca a resposta. A não ser que você seja mais descrente que os ateus."
O anúncio é da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap). O trecho grifado (por mim) é uma confissão da habilidade que os publicitários têm pra chamar atenção sem tomar partido ("nunca fundamentalista"), sem bulir com ninguém, mesmo quando se mete em polêmicas espinhosas como essa. Isso não é novidade. Assim como não é novidade gente se dando bem usando o nome de Deus. Agora, alguém se promover às custas do ateísmo é a primeira vez que eu vejo. Publicidade é isso: a arte de surpreender sempre sem mudar nunca.
26.1.09
9.1.09
Fã vascaíno de Zé Ramalho
Mais um subproduto do doc que eu e uma galera fomos filmar em Brejo do Cruz, em outubro, sobre Zé Ramalho.
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